Não falta quem espere que o notável preso do momento abra a boca na prisão. Caso atirasse em Temer, o presidente passaria por maus bocados
Há quem pense em propor ao juiz Sergio Moro o bloqueio de uma possível delação de Eduardo Cunha. O ex-deputado, preso há poucos dias, poderia empurrar o Brasil para o abismo, como dizem as línguas mal acomodadas à boca. Ele seria, e de fato é, senhor de muitos segredos.
Por isto é necessário Cunha falar mesmo se perturbar, por exemplo, a tranquilidade de Michel Temer, substituto de Dilma na Presidência da República a partir de um golpe parlamentar.
Resgate-se contra essa proposta indecente o brado retumbante de Stanislaw Ponte Preta: “Restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos”.
Temer e Cunha, ou Cunha e Temer, são irmãos siameses na teoria e na prática política.
A prisão de Cunha arrancou da mídia manchetes sobre o enorme desassossego brotado no Palácio do Planalto. Seria preocupação com os ministros da casa? Moreira Franco, Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima ou o senador Romero Jucá?
Moro criou o maior obstáculo para a estabilização de um governo que navega sem rumo, atento apenas a um curto programa com reações diretas nas camadas mais pobres do Brasil.
A pressão vai aumentar. Os movimentos sociais vão reagir. Pesquisa recentemente divulgada pelo Instituto MDA mostra uma rejeição à proposta de aumentar a idade para a aposentadoria.
Resultado entre as cinco regiões cobertas pela pesquisa: no Sudeste, há um apoio de 19%, a maior aprovação; no Sul, cai para 15%; no Centro-Oeste, desce para 11%; e no Norte/Nordeste desaba para 9%.
Em abril passado, Michel Temer passou pelo Palácio dos Bandeirantes para conversar com Geraldo Alckmin. A cabeça da presidenta Dilma Rousseff, ambos sabiam, seria mesmo decepada. Os advogados de Temer, àquela altura, já estudavam a forma de separar as contas de campanha sob investigação. Gilmar Mendes, na presidência do Tribunal Superior Eleitoral, terá de fazer milagre. Esse problema, no entanto, é secundário. O problema é Cunha.
O presidente orientou seus ministros a não cederem ao choque da prisão de Cunha. Tenta evitar, com isso, o carimbo do desânimo na administração, mas ele terá de falar isoladamente sobre o caso. Neste ponto, será obrigado a contornar o bloqueio armado por Cunha. O ex-deputado, em nota, considerou “absurda” a própria prisão e contestou a competência de Moro para prendê-lo. Desafiou a vaidade.
Temer, perguntado sobre isso, não poderá responder à rotineira pergunta com a rotineira frase: a Justiça cumpre seu papel.(fonte:carta capital)