Ainda assim, a maioria fica refém da falta de garantias e de direitos. A saída para formalizar a situação é recorrer a empresas que terceirizam essa atividade
Há dois anos, Shirley Fernandes, 34, trocou a profissão de empregada doméstica pela de diarista. Não foi propriamente uma escolha. Depois de dar à luz, decidiu ficar um tempo a mais com o bebê e pediu demissão. Porém, quando tentou voltar a trabalhar, não conseguiu mais encontrar uma casa que quisesse contratá-la com carteira assinada. Apelou, então, para as faxinas avulsas. “Quando comecei, estava com os cinco dias da semana trabalhando. Hoje, consigo dois, em uma mesma casa, ou três. Mas, como as pessoas estão sem dinheiro, a gente tem que se virar com isso.”
Shirley tem pouca opção. De acordo com os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil chegou à marca de 12 milhões de desempregados — uma taxa de 11,8%, no trimestre de junho a agosto, maior que a última avaliação, de março a maio, que foi de 11,2%. Entre os trabalhadores domésticos, também houve queda: 158 mil deles perderam o emprego no mesmo período. O problema ainda se torna maior no nicho em que Shirley está inserida: sem os direitos trabalhistas assegurados, esses profissionais, além de sofrerem os efeitos da crise econômica, não garantem sua aposentadoria.
Creuza Maria Oliveira, presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, afirma que a lei que regulamentou a Emenda Constitucional 72, que ampliou os direitos dos trabalhadores domésticos, é discriminatória com as diaristas e essa bandeira de luta precisa ser levantada, ainda mais em um período de crise econômica. “Argumentam que elas não têm vínculo porque ficam, no máximo, dois dias. Mas há professores e médicos que também trabalham apenas um dia em um local e têm direito à carteira assinada”, deduz.
A lei, que garantiu benefícios como seguro-desemprego e auxílio-creche, assegurou a muitos trabalhadores o sonho da carteira assinada. Mas exigiu de vários outros que se contentassem com as faxinas únicas, já que as famílias evitam o gasto maior da contratação formal. Rosinalva da Silva Araújo, 36 anos, perdeu seu trabalho de cinco anos quando as mudanças ocorreram, em 2015, e começou a viver das diárias. Ela afirma que, em 2016, a quantidade de trabalho diminuiu e o valor pago por ele ficou estável.
“E se a pessoa quer mais de um dia, ainda dou desconto, para garantir o cliente. A média é R$ 140 mais R$ 10 para as passagens. Ainda bem que todos pagam direito. Só que o nosso serviço é mais puxado porque fazemos tudo em dia e tudo acumula.” Creuza Maria Oliveira diz que o problema afeta as diaristas de forma mais ampla. “Elas ficam sem férias e têm problemas de saúde porque não descansam. Muitas delas fazem, em um dia, o que é o trabalho de uma semana. Não é uma questão só de dinheiro, mas de cuidado”, reclama.
Segundo a presidente, a federação tem mantido diálogo com parlamentares favoráveis à garantia do vínculo empregatício a partir de dois dias na semana. Até o momento, a jurisdição reconhece que ele só existe a partir do terceiro dia. A solução parece estar em “mudar” o patrão. Ana Claudia Costa Carvalho é proprietária de uma empresa que oferece serviços de limpeza para casas, apartamentos e comércios. Com isso, ela contrata as diaristas com carteira assinada, terceirizando o trabalho e dando garantias às suas empregadas. “Elas são contratadas como auxiliares de serviços gerais. Têm sindicato próprio, vale-alimentação, vale-transporte e todos os outros direitos. Isso é bom para elas e para o cliente”, frisa.(fonte:correio braziliense)