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Um mês do exílio de Eduardo Cunha

Afastado do comando da Câmara dos Deputados pelo Judiciário, Eduardo Cunha tenta a todo custo sepultar o processo de cassação que avança no Conselho de Ética

Desde a tarde do dia 5 de maio, quando os onze ministros do Supremo Tribunal Ferderal (STF) decidiram apeá-lo da cadeira de presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) mantém sua rotina impassível: acorda antes do sol raiar todos os dias, veste-se com terno e gravata, abotoa o broche concedido aos parlamentares em exercício e inicia sua agenda de reuniões com advogados, intervalada por telefonemas para sua poderosa rede de mosqueteiros em ação no Congresso e a participação na rádio evangélica Melodia, do Rio de Janeiro. É da residência oficial da presidência da Câmara que Cunha ainda comanda algumas das mais importantes articulações políticas ocorridas nos corredores e no plenário da Casa, conforme o interesse em jogo no dia – e eventual promessa de ajuda para salvar seu próprio mandato quando a derradeira votação do processo de cassação chegar.

“É clara a vontade dele de voltar à presidência. A gente chega e ele quer saber das coisas, do clima, do que estão dizendo sobre as ações do governo. Pergunta sobre tudo”, narra um aliado que o visitou recentemente.

Réu na Operação Lava Jato, Eduardo Cunha teve o mandato suspenso pelo Supremo por suspeita de tentar obstruir o processo contra ele no Conselho de Ética. A manutenção do mandato, aliás, é sua principal obsessão uma vez que o foro de deputado lhe assegura relativa distância do juiz federal Sérgio Moro, responsável pelas sentenças da Lava Jato. Segundo relato de seus escudeiros, que o visitam com frequência, Cunha só muda o semblante imperturbável quando uma palavra é pronunciada: prisão. Na semana passada, demonstrava ansiedade ante os rumores que ganharam força em Brasília, segundo os quais a Polícia Federal poderia bater à sua porta com um mandado de prisão expedido pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo.

“Não estou agindo no conselho, e sim me defendendo de acusações visando convencer da improcedência da acusação”, afirmou Cunha ao site de VEJA.

Do “exílio”, Eduardo Cunha viu se concretizarem os seus principais acordos políticos, como as canetadas dadas por auxiliares na Câmara dos Deputados. O seu controverso sucessor, deputado Waldir Maranhão (PP-MA), despachou atos com o objetivo de barrar o Conselho de Ética. O peemedebista também conseguiu emplacar aliados em cargos estratégicos na gestão do presidente interino Michel Temer: um dos seus principais braços-direitos, o líder do PSC, André Moura (SE), foi alçado líder do governo na Casa. Moura recebeu o aval do chamado “centrão”, grupo formado por doze partidos, dos quais os principais líderes mantêm-se fieis a Cunha – entre eles, Jovair Arantes (PTB-GO), Paulinho Pereira (SD-SP) e Rogério Rosso (PSD-DF), além do próprio André Moura.

Nos corredores do Congresso e do Planalto, por outro lado, há quem diga que o peemedebista já não tem a mesma influência de 30 dias atrás – o que se tratando da figura e da força conhecidas do peemedebista, ainda não se pode ser traduzido em rendição. Se, até pouco tempo a casa e o gabinete do peemedebista registravam um fluxo constante de aliados, o movimento, a cada dia, é menor. Longe da presidência, Cunha não consegue agradar aliados indicando-os para relatorias de projetos valiosos e para o comando de comissões. “Quando perde a caneta, perde-se a força sobre qualquer pessoa”, resume um congressista que jura seguir fiel a Cunha. Ele reconhece, no entanto, que os conselhos e estratégias do peemedebista seguem sendo adotados.

O estilo truculento também pesa para o distanciamento de parlamentares. Sem a máquina da Câmara, o presidente afastado perde apoio daqueles que não precisam mais suportar o seu destempero. Um deles foi o primeiro secretário da Câmara, Beto Mansur (PRB-SP), um de seus principais aliados até o mês passado. Conforme relatos, o peemedebista chegou a gritar com ele na frente de outros parlamentares enquanto tratava dos benefícios que manteria com o mandato suspenso – a Câmara acabou lhe concedendo todas as prerrogativas, como o salário integral, jatos da Força Aérea Brasileira (FAB) à disposição e a residência oficial.

A maioria dos deputados só aceita falar sobre Cunha na condição de anonimato por medo de retaliações caso ele consiga se safar. “Fica claro que há um enfraquecimento. Mas também é evidente que nos bastidores, como presidente afastado, ele usa todas as forças e armas que tem. O que se diz é que com o desvio do dinheiro da Petrobras, Eduardo Cunha financiou de 120 a 150 deputados. Agora ele tem uma espada na cabeça de cada um que participou desse esquema”, afirma um congressista. Outro ex-colega emenda: “Eu sempre tive uma boa relação com ele, que foi correto e me deu espaço. O ruim é que nunca joga de verdade, de peito aberto. Ele começou a me dar facada pelas costas. Minha relação era política, mas vi que na política eu não posso confiar no Eduardo”, disse.

Esperança – Ainda que a Justiça não tenha definido um prazo para Cunha poder voltar à ativa, o peemedebista ainda alimenta a expectativa de voltar ao comando da Câmara dos Deputados – a próxima eleição da Mesa Diretora é somente em fevereiro do ano que vem. Por isso, ele busca manter-se informado de cada decisão e bastidor da Casa.

Cunha ignora as pressões e resiste a renunciar ao posto, o que abriria caminho para a convocação de novas eleições, a derrubada do seu sucessor, Waldir Maranhão, e ainda seria um aceno para os julgadores de seu processo de cassação.

Assim como fazia no processo de impeachment de Dilma Rousseff, o peemedebista tem no papel a contabilidade de votos e acredita em uma punição mais branda no colegiado. Pode ser decisivo o posicionamento da deputada tia Eron (PRB-BA). Nos bastidores, fala-se que Cunha teria prometido ao PRB um ministério em troca da absolvição. O presidente da legenda, Marcos Pereira, foi nomeado ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.

Retomada da normalidade – Após um início turbulento, a Câmara dos Deputados retoma a normalidade sob a gestão de Waldir Maranhão, que era vice-presidente de Eduardo Cunha. Depois da ridícula tentativa de anular a admissibilidade do impeachment de Dilma, Maranhão equilibra-se na cadeira presidente de maneira estratégica: para fugir de protestos, terceiriza o comando do plenário e de decisões importantes para outros membros da Mesa Diretora. Mesmo com um presidente “fantasma”, projetos prioritários do governo interino de Michel Temer estão sendo aprovados.

“A Casa vai sobrevivendo. O afastamento do Eduardo é ruim porque é ele muito dinâmico, e a Câmara funciona com muita velocidade no trato do regimento e de ações legislativas. As coisas funcionam porque nós, líderes, fizemos funcionar”, afirma o deputado Jovair Arantes, um dos mais próximos de Cunha e membro do chamado “centrão”.

“Para a gente interessa que a pauta da Câmara está andando. Qualquer tipo de envolvimento direto do governo nesse tema gera dificuldades. As coisas estão sendo tocadas, não tem por que a gente ficar em uma angústia”, afirmou o ministro Geddel Vieira Lima, responsável pela articulação política do governo. Geddel fez, na última semana, visita a Eduardo Cunha. Segundo ele, o breve encontro foi apenas um gesto de “solidariedade”.

O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), agendou a votação do parecer que recomenda a perda de mandato de Cunha para a próxima terça-feira. Quem conhece Cunha, duvida.(fonte:veja)

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